Introdução

Mata Atlântica

A Mata Atlântica, uma das áreas mais diversas do território brasileiro, se estendia de forma contínua pela costa brasileira, desde o Rio Grande do Norte (6ºS) até o Rio Grande do Sul (30ºS), adentrando o interior do território brasileiro, principalmente pela Bahia, Minas Gerais e São Paulo, em uma cobertura aproximada de 15% do território brasileiro. Devido à forte devastação, a área original do Bioma foi fragmentada, estando hoje reduzida a pequenos vestígios, porém ainda ocupando os 17 Estados brasileiros de sua área original (Fundação SOS Mata Atlântica & INPE, 2011). A Mata Atlântica está entre os mais importantes “hotspots” mundiais – áreas com grande riqueza de espécies, alto grau de endemismo e sob forte ameaça (Myers et al. 2000).
Uma intrincada rede de bacias e microbacias fluviais entrecortam a Mata Atlântica. A importância das bacias hidrográficas tem sido destacada em estudos de conservação, reconhecidas como redes de drenagem formadas pelos corpos hídricos continentais, em especial rios e córregos, moldando a paisagem, conferindo padrões previsíveis sobre sua topografia, geoquímica, clima e distribuição de espécies vegetais e animais (Moulton & Souza, 2006).

Tabuleiros

Cada trecho da Mata Atlântica tem feições características da paisagem, permitindo uma manifestação de diferentes formas de vida. Entre o sul da Bahia e o norte do Espírito Santo, uma intensa mata se espalhava até onde a vista podia alcançar. Essa mata de tabuleiro, como é conhecida, é cortada por rios e riachos, entre o norte do Rio Doce, no Espírito Santo, e o Rio Santo Antônio, no extremo sul da Bahia.

No domínio das florestas de tabuleiro estão presentes rios maiores ao norte, como o rio Doce, tem suas cabeceiras no cerrado mineiro. Estas grandes bacias hidrográficas têm importância estratégica, como o Rio Doce e Rio Mucuri. Desembocaduras fluviais de rara beleza cênica, como o Rio Corumbau, que banha as terras indígenas Pataxó desde o emblemático Monte Pascoal até a Barra Velha. Os sistemas hídricos são os vertedouros finais, que levam sedimentos e nutrientes rumo ao mar. A exemplo o Rio Peruípe, responsável por carrear nutrientes até o banco de Abrolhos, a maior formação coralínea do Atlântico Sul.

Bacias

Bacias e microbacias de pequenas dimensões, cujo rio principal não ultrapassa 60 Km de extensão (e.g. rio Cahy, rio Trancoso). Estes pequenos sistemas hídricos, muitos deles isolados, dão abrigo a uma rica fauna de peixes de riacho, com muitas espécies endêmicas, que vêm sendo avaliadas nos últimos anos por nossa equipe (e.g. Cetra et al., 2010; Sarmento-Soares et al., 2007; 2009; Sarmento-Soares & Martins- Pinheiro, 2012; 2013; 2014; 2017; 2019).

Essas terras são habitadas por povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pescadores, extrativistas, agricultores, fazendeiros, núcleos urbanos, e muitos outros, que dependem das águas dos rios e córregos para viver.
Nesse sentido, conservar a Mata Atlântica de tabuleiros significa manter os processos hidrológicos responsáveis pela quantidade e qualidade da água potável para todos os povos dessa vasta região.

Os ambientes de água doce incluem uma variedade de habitats que vão desde as cabeceiras íngremes com águas rápidas até leitos nas partes baixas com gradientes lentos. As porções dos terços fluviais alto a médio possuem poções profundos, margeados por rochas, pedras, seixos rolados e corredeiras sob cascalho. Nas porções baixas dos rios maiores predominam substratos de areia, argila e lama. Uma abordagem sobre a ictiofauna de riachos é fornecida em Buckup (1999).

Peixes

No Brasil vivem quase ¼ das espécies de peixes de água conhecidas no planeta (Albert et al. 2011). Esta enorme diversidade ainda está sendo desvendada, e a cada ano são descritas novas espécies, e também muitas informações descritivas quanto a ecologia e conservação das espécies. Muitos peixes vivem em pequenas populações, em biótopos específicos, como alagados marginais (e.g. o peixe anual Xenurolebias myersi) ou córregos florestados (e.g. o bagrinho, Acentronichthys leptos). Face a vulnerabilidade a que estão sujeitas, muitas espécies da região encontram-se sob algum grau de ameaça. Nesse sentido, conhecer quais são as espécies da Mata Atlântica e onde vivem é de extrema importância para a definição de políticas públicas de conservação

Objetivos

O presente guia teve início com o projeto Peixes Meninos, em Cumuruxatiba, de popularização de peixes da região. O Projeto Peixes Meninos foi estabelecido com o intuito de proporcionar a um grupo de jovens de Cumuruxatiba um maior e melhor conhecimento sobre os peixes de água doce no extremo sul da Bahia. Através da iniciação científica voluntária, estes jovens desenvolveram o espírito da pesquisa tanto no âmbito científico – com o estudo dos peixes da região – como no âmbito social – pela interação com personagens do lugar (Sarmento-Soares & Martins-Pinheiro, 2006). A atividade do projeto aconteceu entre os anos de 2005 a 2007, e culminou com a organização de um livreto “projeto Peixes Meninos” ilustrado e com uma linguagem acessível, lançado durante a exposição Quigême Zabellê, em Cumuruxatiba, Prado, Bahia.

Nosso objetivo é divulgar a diversidade de peixes de água doce para conservação da fauna aquática e fortalecer ações socioambientais no domínio da floresta de tabuleiro. Esperamos aliar a preservação já existente com a conservação dos rios, das espécies, dos solos e das pessoas.


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