Tradução do Inglês por Claudio Miklos
Este poema é de autoria do grande mestre Zen Dogen, e sua profundidade inegável. Possui as qualidades tipicamente Zen se paradoxismo e lirismo transcendental, ainda que simples em palavras. |
Esta versão é de autoria de Hakuyu Taizan Maezumi Roshi, este texto foi encontrado na extinta Home Page de John Bannon, de nome Kanzeon Home Page . A tradução do inglês foi feita por Claudio Miklos, com autorização de John Muju Bannon. Os comentários entre chaves são de sua inteira responsabilidade. |
Quando todos os Dharmas são buddha-dharma,
há iluminação e delusão,
prática, vida e morte, buddhas e criaturas.
Quando os dez mil dharmas são despojados de Eu,
não há delusão, nem iluminação, nem buddhas, nem criaturas, tampouco vida e morte.
O caminho de buddha transcende ser e não-ser;
portanto não há vida e morte, delusão e iluminação, criaturas e buddhas.
Não obstante,
flores desabrocham com nosso apego, e sementes germinam com nossa aversão
Fomentar o Eu e concretizar os dez mil dharmas é delusão;
Que os dez mil dharmas, [são] avanço e concretizar os eus [as naturezas individuais], iluminação.
São buddhas os que iluminam a delusão.
São criaturas os que estão deludidos na iluminação.
Ademais, existem os que alcançam iluminação sobre a iluminação;
[e] existem os que estão deludidos dentro da delusão.
Quando buddhas são verdadeiros buddhas,
não precisas estar consciente de ser um buddha.
Ainda assim, és o buddha realizado,
e além disso progrides na realização [da natureza] de buddha.
Vendo formas com a plenitude de corpo e mente,
ouvindo sons com a plenitude de corpo e mente,
tu entende-os então profundamente.
Todavia isto não é como um espelho com reflexos,
nem como água sob a lua –
Quando um lado é concretizado,
o outro lado é obscuro.
Estudar o caminho de buddha
é estudar o Eu.
Estudar o Eu
é esquecer o Eu.
Esquecer o Eu
é estar iluminado pelos dez mil dharmas.
Iluminar-se pelos dez mil dharmas
é libertar teu corpo e mente e os [corpos e mentes] dos outros.
Nenhum resíduo de iluminação permanece,
a esta iluminação atemporal continua para sempre.
Quando primeiramente buscas a verdade,
separas a ti mesmo para longe de teu ambiente.
Quando transmites corretamente a verdade para ti mesmo,
serás teu Eu original neste [preciso] momento.
Quando num barco
se observas a costa
podes presumir que a costa está se movendo.
Mas olhando o barco diretamente, sabes que é o barco que se move.
Se examinas os dez mil dharmas com corpo e mente deludidos,
irás supor que tua mente e natureza são permanentes.
Mas se praticas profundamente e retornas ao verdadeiro Eu,
ficará claro que os dez mil dharmas são desprovidos de Eu.
Madeira transforma-se em cinzas
e não retorna a ser madeira novamente.
Mas não suponhas que as cinzas são “depois” e a madeira “antes”.
Devemos compreender que madeira está no estado de ser madeira
e continua assim antes e depois.
Todavia sendo assim no antes e depois,
tal fato é independente deles.
Cinza está no estado de ser cinza
e assim continua antes e depois.
Exatamente como madeira não retorna a ser madeira novamente depois de se tornar cinzas,
assim após a morte,
não retornas à vida novamente.
Assim, que a vida não se torna morte
é um ensinamento confirmado no buddha-dharma;
Que a morte não se torna vida
é um ensinamento confirmado no buddha-dharma;
conseqüentemente, morte é chamada de não-extinta.
Vida é um fim em si mesma.
Morte é um fim em si mesma.
Por exemplo, elas são como inverno e primavera.
Nós não pensamos que inverno se torna primavera,
nem dizemos que primavera torna-se inverno.
Atingir a Iluminação
é como a lua refletida na água.
A lua não se molha, nem a água é perturbada.
Apesar de sua luz ser extensa e grande,
a lua é refletida mesmo numa poça de um centímetro de diâmetro.
Toda a lua e todo o firmamento
são refletidos numa gota de orvalho sobre a grama,
em uma gota de água.
Iluminação não perturba a pessoa,
assim como a lua não perturba a água.
Uma pessoa não bloqueia a iluminação,
assim como a gota de orvalho não bloqueia a lua no firmamento.
A profundidade da gota eqüivale à altura da lua.
Pela duração do reflexo,
você pode examinar a vastidão ou insignificância da água,
e pode discernir o brilho ou obscuridade
da lua celestial.
Quando a verdade não preenche
nosso corpo e mente,
nós achamos que temos o suficiente.
Quando a verdade preenche nosso corpo e mente,
nós percebemos que algo está faltando.
Por exemplo,
Quando olhamos para as quatro direções de um bote no meio do oceano
onde nenhuma terra está à vista,
nós vemos apenas um círculo e nada mais.
Nenhum outro aspecto é aparente.
Contudo, este oceano é tampouco redondo ou quadrado,
e suas qualidades são infinitas em variedade.
É como um palácio.
É como uma jóia.
Apenas parece circular
tanto quanto nossa visão é capaz de alcançar por vez.
Os dez mil dharmas
são semelhantes a isto.
Conquanto que vida comum e vida iluminada
assumem muitos aspectos,
nós apenas reconhecemos e entendemos
através da prática
o que o penetrante poder de nossa visão pode alcançar
Para se apreciar os dez mil dharmas,
nós devemos saber que embora eles possam parecer redondos ou quadrados,
as outras qualidades dos oceanos e montanhas
são infinitas em variedade;
além disso,
outros universos situam-se em todos os quadrantes.
Assim é não só em torno de nós
mas também aqui [onde estamos],
e numa simples gota d’água.
Quando um peixe nada no oceano,
não há limites para a água,
não importa quão longe ele nade.
Quando um pássaro voa no céu,
não há limites para o ar,
não importa quão longe ele voe.
Contudo, nem peixe ou pássaro
jamais deixou seus elementos
desde o início.
Quando a necessidade é grande,
é suprida largamente.
Quando a necessidade é pequena,
é suprida de modo menor.
Dessa forma,
nenhuma criatura jamais torna-se limitada
de sua própria plenitude.
Onde quer que fique,
não falha em cobrir o terreno.
Se um pássaro abandona o ar,
morrerá imediatamente.
Se um peixe abandona a água,
morrerá imediatamente.
Saiba, então,
que água é vida.
Saiba que ar é vida.
Vida é o pássaro e vida é o peixe.
Além destes, existem outras implicações e ramificações.
Assim, há prática e iluminação,
mortalidade e imortalidade.
Agora, se um pássaro e um peixe
tentam atingir os limites dos seus elementos
em vez de [simplesmente] se moverem nele,
este pássaro ou este peixe não encontrarão seu caminho ou seu lugar.
Alcançando este lugar,
tua vida diária é a concretização da realidade última.
Alcançando este caminho,
tua vida diária é a concretização da realidade última.
Uma vez que este lugar e este caminho
não são nem largos nem pequenos,
nem eu nem outro,
nem existência anterior nem existência imediata,
eles portanto simplesmente existem.
Assim,
se tu praticas e concretizas o caminho de buddha,
quando tu alcanças um dharma,
tu penetras [em] um dharma;
quando tu encontras uma ação,
tu praticas uma ação.
Desde que o lugar está aqui
e o caminho conduz a todo lugar,
a razão dos limites do Conhecido e do Desconhecido
é simplesmente que nosso conhecimento surge com,
e é exercitado com,
a absoluta perfeição do buddha-dharma.
Não praticar pensando nesta conclusão deve se tornar
o objeto de nosso conhecimento e visão
e ser captado conceitualmente.
Muito embora o ato de alcançar a realização seja imediatamente manifesto,
sua natureza íntima não é necessariamente percebida.
Alguns podem descobrir isto
e outros não.
Mestre Pao-che de Ma-Ku Shan
estava se abanando.
Um monge aproximou-se e perguntou,
“Mestre, a natureza do vento é permanente,
e não há lugar que ele não atinja.
Por que, então o senhor insiste em se abanar?”
“Embora tu entendas a natureza do vento com sendo permanente,”
o mestre replicou,
“tu não entendes o significado do seu poder de alcance.”
“Qual o significado de seu poder de atingir todo lugar?” perguntou o monge.
O mestre apenas continuou se abanando.
O monge inclinou-se em profundo respeito.
Esta é a iluminadora experiência
do buddha-dharma
e o processo vital de sua correta transmissão.
Aqueles que dizem que nós não deveríamos usar um leque
porque o vento é permanente,
e assim deveríamos conhecer a existência do vento
sem fazer uso de um leque,
não conhece nem a permanência
nem a natureza do vento.
Devido ao fato de que a natureza do vento
é eternamente presente,
o vento do buddhismo
dá valor ao ouro [as riquezas] da terra
e amadurece o queijo [às margens]
do grande rio.
Extraído do site www.falconi.com.br