A visão do caminho do meio

O Budha apresentou a “Visão do caminho do Meio” muitas vezes, de maneiras diferentes, as quais se acham sumarizadas nos “Três Giros da Roda do Dharma”. Ele ensinou primeiramente em Sarnath, pouco após sua iluminação, a um grupo de seres que não tinham nem grande energia, nem mentes expansivas. Ministrou-lhes as “Quatro Nobres Verdades”: ensinou que toda existência comum é sofrimento, que tal sofrimento resulta de nosso próprio carma e que este carma é gerado através do condicionamento degradado de nossas próprias mentes.
A mente degradada, afirmou, provém de nosso apego à noção de uma individualidade, ou ego. Assim, o Budha demonstrou a natureza sofredora da existência no mundo e suas causas. Em seguida, mostrou a possibilidade da liberação do sofrimento ao alcançarmos o Nirvana.
Para se alcançar o Nirvana, não é suficiente ter inclinação moral, ou o sentimento de poder alcançá-lo: deve-se estar compelido a praticar o caminho a fim de atingir a completa cessação das degradações e do conseqüente sofrimento; cessação esta que é o Nirvana. Neste contexto, “o caminho” significa contra-agir ao apego à noção de ego e auto-existência.
Assim procedendo, podemos nos livrar das degradações de nossas mentes, da necessidade de gerar carma e, desta forma, sermos dispensados da necessidade de gerar carma e, desta forma, sermos dispensados da necessidade de continuadas passagens pelo mundo.
No “Primeiro Giro da Roda do Dharma”, o Shakyamuni não ensinou especificamente a Vacuidade, embora tenha sugerido indiretamente.
A ausência de ego que ele proclamou naquela oportunidade não era a ausência de individualidade num sentido último, mas no sentido mais simples de que não existe nenhum ego, ou auto-natureza, permanente e solidamente individual.
Posteriormente, em Rajgir, ele transmitiu o “Segundo Giro da Roda do Dharma”, os ensinamentos a respeito da ausência de características fundamentais. Ensinou-nos as dezesseis modalidades de Vacuidade: as aparências externas são vazias, o mundo interior dos pensamentos é vazio; tanto as coisas externas quanto internas, em conjunto, são vazias; e, assim por diante, em dezesseis estágios. Desta maneira, ele demonstrou que não existe nenhum ego, não apenas no sentido comum, mas, ainda, que nenhuma realidade inerente pode ser encontrada em coisa alguma, seja lá onde investiguemos.
Mais tarde, em Sravasti, Budha ensinou o “Terceiro Giro da roda”, no qual revela que a Vacuidade não é meramente vazia, mas dá origem a todos os fenômenos e é continuamente expressiva. Este terceiro giro inclui lições sobre a “Fonte dos Tathágatas2” (Tathágata Garba), o ensinamento básico sobre o qual a filosofia da Escola “Mente Única” ou escola “Somente Consciência” (Vijnanavada) foi fundada.
A distinção entre o segundo e o terceiro giros é que, nos ensinamentos de Rajgir, o Budha pregou a Vacuidade como sendo uma função da aparência, isto é, a mais alta qualidade da aparência (a sua falta de verdadeira existência), enquanto que, em Sravasti, ensinou-nos a Vacuidade como uma espécie de fundação a partir da qual tudo é expresso.

Os três Giros, então, compõe o ensinamento da “Visão Correta”.
Do livro: “A PORTA ABERTA PARA A VACUIDADE”
Venerável Kenchen Thrangu Rimpoche – Ed. Bodigaya