Dorothy e a porta trancada



Dorothy e a porta trancada

Texto de Charlotte Joko Beck, extraído do livro”Nada Especial

Todos estamos em busca de alguma coisa. A maioria dos seres humanos sente uma espécie de falta, de algo incompleto, e busca algo que preencha o buraco que sentem. Mesmo aqueles que dizem: -Não estou buscando nada; estou contente com a minha vida”, também estão em uma busca a seu próprio modo. Assim, as pessoas vão para esta ou aquela igreja, para os centros zen ou de ioga, comparecem a workshops de crescimento pessoal – na esperança de encontrar essa peça que falta.

Quero falar com vocês sobre uma garota chamada Dorothy. Ela não morou no Kansas, mas em San Diego, numa i4ensa casa em estilo vitoriano. Sua família morava no solar há várias gerações. Todos tinham seu próprio quarto, e havia aposentos extras e cubículos por toda parte, além de um sótão e um porão. Quando Dorothy ainda era uma garotinha, ela aprendeu que algo de estranho havia naquela casa: no último andar daquela velha mansão vitoriana havia um quarto trancado. Há tanto tempo quanto as pessoas conseguiam se lembrar, aquele quarto sempre permanecera trancado. Corriam rumores de que um dia fora aberto, porém ninguém sabia o que havia lá dentro. A fechadura daquela porta era estranha e ninguém jamais conseguira encontrar uma maneira de abri-la. As janelas daquele aposento também estavam de algum modo bloqueadas. Uma vez Dorothy subiu numa escada pelo lado de fora da casa e tentou ver o que havia lá dentro, mas não conseguiu ver nada.

A maioria das pessoas daquela família estava simplesmente habituada ao aposento com sua porta trancada. Sabiam que estava lá, mas não queriam se importar com isso. Por essa razão era apenas uma coisa que mencionavam. Dorothy porém era diferente. Desde o tempo em que era muito pequenina ainda ficou obcecada com esse quarto e com o que haveria dentro dele. Ela achava que ela precisava abri-lo.

Quase tudo a respeito da vida de Dorothy era normal para uma garotinha daquele tamanho. Ela cresceu, fizeram-lhe tranças no cabelo, tornou-se adolescente, cortou o cabelo segundo a última moda, tinha uma amiga inseparável, um amigo inseparável, ficava toda excitada com as últimas novidades no campo da maquiagem e com a mais nova canção de sucesso. Ela era bastante normal. Todavia nunca desistiu de sua obsessão pelo quarto trancado. De certo modo, isso dominava a sua vida. As vezes ela subia até o último andar e sentava-se diante da porta e permanecia apenas olhando para ela, indagando-se sobre o que haveria por trás.

Quando Dorothy ficou um pouco mais velha, ela sentia o quarto como um aposento ligado ao que lhe fazia falta na vida. Por isso deu início a vários tipos de treinamentos e práticas na esperança de encontrar o segredo que lhe permitiria abrir a porta. Tentou de tudo: foi a vários centros, consultou diversos professores, buscando a fórmula para destrancar a porta. Participou de workshops, passou por processos de renascimento, hipnose e muito mais. Fez de tudo. Nada, contudo, destrancava a porta para ela. Sua busca prosseguiu durante muito tempo, ao longo de todos os anos da universidade e pós-graduação. Ela criou técnicas para se levar a vários estados alterados de consciência, e continuava ainda assim incapaz de abrir aquela porta.

Então um dia, quando chegou em casa, notou que ela estava deserta. Ela subiu até o último andar e sentou-se em frente da porta trancada. Usando uma de suas práticas esotéricas ela entrou num estado profundo de meditação. Obedecendo a um impulso, estendeu a mão e empurrou a porta – que começou a abrir. Ela estava eletrizada. Em todos aqueles longos anos de tentativas para abrir a porta, nada parecido com aquilo havia ocorrido. Dorothy sentiu medo e excitação ao mesmo tempo. Tremendo, forçou-se a atravessar aquela porta. Foi quando descobriu…

Desapontamento e confusão. Dorothy encontrou-se não num novo, ou estranho, ou maravilhoso espaço naquele aposento misterioso, mas imediatamente de volta ao piso térreo daquela velha casa vitoriana, em meio a todas as coisas antigas e tão conhecidas. Era a mesma perspectiva, ela estava na mesma localização com a mesma conhecida mobília de sempre. Tudo era apenas como sempre tinha sido. Decepcionada e intrigada ao mesmo tempo, algumas horas depois ela subiu as escadas até o último andar e entrou no aposento misterioso. A porta ainda estava trancada. Dorothy havia aberto a porta – e não havia aberto a porta.

A vida seguiu em frente. Dorothy casou-se. Teve um casal de filhos. Ainda morava na mesma casa vitoriana, com sua família. Era uma boa esposa e uma boa mãe. Ainda assim, nunca desistiu de sua obsessão. Aliás, sua única experiência de ter aberto a porta motivava-a sempre mais. Ela passava muito tempo no último andar diante da porta trancada, de pernas cruzadas, tentando abri-la. Já o havia feito uma vez, poderia fazê-lo de novo. E com certeza, depois de tantos anos tentando, aconteceu de novo: ela empurrou a porta e esta se abriu. Excitada, ela pensava: “Hoje é o dia!”. Atravessou a porta – e outra vez se encontrou no térreo da mesma velha casa vitoriana, onde morava com o marido e os filhos. Correu de novo até o último andar até o aposento misterioso e o que encontrou? A porta continuava trancada.

O que se pode fazer? Uma porta trancada é uma porta trancada. Dorothy deu continuidade à sua vida. Ficou com os cabelos grisalhos. Continuava passando um bom tempo sentada diante da porta trancada. Era uma esposa e mãe bastante boa, mas sua atenção ainda se dirigia sobretudo para a porta trancada. E ela era uma pessoa persistente, assídua: não desistia assim tão fácil. De tempos em tempos, ela conseguia passar pela porta e entrar no aposento, porém sempre era remetida de volta ao térreo, exatamente para o plano onde levava a sua vida.

Durante todo esse tempo a casa foi aos poucos sendo preenchida com coisas. Os membros da família pareciam acumular cada vez mais coisas e os quartos extras tornaram-se depósitos de lixo. A casa foi ficando tão entupida que não havia mais espaço para os convidados, e quase que os moradores também ficaram sem o seu. Não havia espaço para mais nada na casa exceto para Dorothy, o marido e os filhos, o que também estava ótimo porque estavam todos tão preocupados com suas próprias pessoas que mal conseguiam pensar em tomar conta de alguma outra coisa.

Aos poucos, a obsessão de Dorothy esgarçou-se. Sua luta para abrir aquela porta começou a ficar obsoleta. Em vez de passar tanto tempo diante da porta, ela começou a ficar um pouco mais com os filhos e netos, tomando também conta da casa: os pisos foram renovados, as cortinas trocadas etc. A casa não estava em mau estado, mas havia sido um pouco negligenciada, porque Dorothy tinha se ocupado apenas de seu projeto de sentar diante da porta. Sua atenção lentamente foi deslocada de volta para o cuidado necessário às coisas diárias que precisavam ser atendidas. Foi um lento processo. Às vezes ela ainda subia até o último andar e olhava para a porta, mas se a abrisse sabia o que iria encontrar. Muito devagar, o desencorajamento e o desapontamento instalaram-se. Cada vez mais ela se esquecia de tudo o que não fosse só viver sua vida, tomando conta das coisas de um momento para outro. E então um dia ela subiu até o último andar e por acaso olhou para a porta que estava trancada. Uau! Estava escancarada! Lá dentro, plenamente visível, estava um confortável quarto para hóspedes. Havia uma bela cama e uma cômoda e todos os pequenos acessórios que tornariam confortável aquele quarto para um hóspede.

Ao ver aquele espaçoso e delicioso quarto de hóspedes, Dorothy percebeu no que havia se tornado o resto da casa. Ela via como tudo estava entulhado e confuso e como era difícil andar livremente pela casa. Diante dessa constatação a mudança começou. Sem que fizesse muito alguma coisa, os aposentos daquela velha mansão vitoriana começaram a desentulhar-se por si. Começou a haver mais espaço para as coisas e as pessoas naquela casa. Apareceu espaço. Era como se todo o monte de coisas fosse imaterial, lixo fantasmagórico. Nem estava lá realmente, afinal de contas. A casa voltou ao que tinha sempre sido. Aliás, sempre tinha existido muito espaço para convidados, e agora Dorothy percebia que a porta nunca estivera trancada, para início de conversa. Sempre estivera aberta. Só sua rígida postura de empurrá-la mantivera-a fechada.

Essa é a nossa ilusão essencial a respeito da prática: que a porta está trancada. A ilusão é inevitável: todos a temos, num grau ou noutro. Enquanto pensarmos que a porta está trancada, ela está trancada. Para tentar abri-la fazemos de tudo. Vamos a todo centro possível, participamos de workshops, experimentamos isso e aquilo, para, por fim, descobrirmos que nunca esteve fechada.
Apesar disso, a vida de esforços inúteis que Dorothy levou para ela foi perfeita. Era isso que ela precisava fazer. Na realidade, é isso que todos nós temos de fazer. Temos de dar à nossa prática tudo o que temos para conseguirmos perceber que, desde o início, não existe senão perfeição. O quarto está aberto, a casa está aberta, se não a entulharmos com lixo inexistente. Mas não existe meio de sabermos disso antes de sabermos disso.

Uma forma de disciplina espiritual cristã é a prática da presença de Deus. Como cristãos, estamos em busca daquela radiação em todas as coisas que os místicos chamam de a face de Deus. Essa radiação não está escondida em algum lugar muito distante, mas bem aqui e agora, exatamente embaixo do nosso nariz-. Da mesma forma, Dorothy percebeu que aquilo que tinha buscado sua vida inteira era simplesmente a sua própria vida: as pessoas, a casa, os quartos. Todos estes eram a face de Deus.
Nós porém não enxergamos isso. Se realmente o víssemos, não torturaríamos os outros nem a nós da maneira como o fazemos. Não somos gentis; somos manipuladores, desonestos. Se víssemos que essa vida que estamos levando é a própria face de Deus, não seríamos capazes de nos comportar dessas maneiras, não em razão de algum mandamento ou interdição, mas só porque veríamos a vida tal como ela é.

Não é que a prática – sentar-se diante da porta – seja inútil, mas uma grande parte do que chamamos prática – caçar ideais ou a iluminação – é uma ilusão. Isso não abre a porta. Enquanto não enxergarmos esse fato com a mesma clareza com que comemos nosso mingau de aveia pela manhã, teremos de atravessar muitos desvios e atalhos, muitos desapontamentos e enfermidades – que são nossos mestres na vida. Todas essas lutas fazem parte do aprendizado relativo à porta. Se praticamos bem, mais cedo ou mais tarde esse quebra-cabeça fica mais claro e a porta abre-se com mais freqüência.

ALUNA: Parece que Dorothy poderia ter perdido menos tempo se tivesse sentado na cozinha, no meio de sua família e de seus afazeres cotidianos, em vez de se retirar para o último andar da casa, distante de tudo o mais.

JOKO: Sempre buscaremos lá onde pensamos que a resposta está enquanto não estivermos prontos para enxergar. Fazemos o que fazemos até que não o fazemos mais. Isso não é bom nem mau; é só como as coisas são. Temos de desbastar-nos de nossas ilusões. Se dissermos para nós mesmos: “O caminho para abrir a porta está em ficar mais tempo com meus filhos”, também isso se torna apenas uma outra idéia obsessiva. Passar tempo com meus filhos para tornar-me iluminada talvez não vá me tornar uma mãe melhor, afinal de contas.

ALUNA: A prática não diz respeito a abrir o coração? Não é isso que Dorothy estava realmente tentando fazer?

JOKO: Sim, essa é uma forma de descrever a coisa. E ela descobriu que…?

ALUNO: Que seu coração já estava aberto.

JOKO: Certo. Os pais que não conseguimos agüentar, o parceiro que nos magoou, o amigo que irrita: não há nada de errado com eles, a menos que pensemos que há. Enquanto não estivermos prontos para ver isso porém, não o veremos.

ALUNO: Se a história é a respeito de um quarto de hóspedes, então Dorothy nunca nem chegou a pensar em ter convidados.

JOKO: Certo. Ela nem pensaria nisso.
Nós pensamos: “Eu deveria ser mais simpático, mais educado, mais hospitaleiro-. Contudo, se estamos emaranhados em nossas ilusões, não podemos ser verdadeiramente hospitaleiros. Até desempenhamos os movimentos nesse sentido, mas ser de fato hospitaleiro significa ser apenas quem se é, como somos. Não podemos acolher ninguém em nossa casa se primeiro não tivermos acolhido a nós mesmos.

ALUNO: ,Quando estamos emaranhados em nossos melodramas pessoais, como Dorothy estava, não estamos verdadeiramente disponíveis aos outros. Quando enxergamos mais além de nosso melodrama pessoal, conseguimos ver com mais objetividade as necessidades dos outros e responder a elas.

JOKO: Sim. Todos nós já passamos pela experiência de estarmos tão contrariados que simplesmente somos incapazes de ouvir os problemas de um outro indivíduo. Não temos espaço para isso. Todo o nosso espaço está ocupado com nossas próprias coisas. Não temos nenhum “quarto de hóspedes”. Mesmo assim, não podemos simplesmente dizer -Não vou ficar obcecada” e desejar que isso aconteça. Pois então achamos que ainda há um buraco em nossa vida, que temos de destrancar a porta e descobrir o que está do outro lado.

ALUNO: Minha prática tem sido uma série de decepções. Eu imagino: “Esse workshop vai resolver essa situação para mim”. Participo dele e embora possa ser útil de alguma maneira, em última análise é desapontados. Acho muito difícil simplesmente permanecer com o meu desapontamento, sentir a minha vulnerabilidade. Em vez disso, encubro-os de alguma forma e digo para mim mesmo: “Basta continuar tentando. Vou descobrir um outro workshop”.

ALUNO: Sinto que perdi muito tempo e energia, que desperdicei momentos preciosos de minha vida queixando-me de meus pais e de minhas condições de vida, tudo no esforço de destrancar a porta.

JOKO: Não adianta nada olhar para trás e dizer: “Eu deveria ter sido diferente”. Num dado momento, somos do jeito que somos e vemos o que somos capazes de ver. Por essa razão, a culpa sempre é inapropriada.

ALUNA: Parece como se tivéssemos que atravessar um certo tanto de sofrimento. Temos de ser crucificados antes de nos entregar.

JOKO: Sem exagerarmos na dramatização desse aspecto, isso é verdade. Somos muito teimosos. E isso também está certo.

ALUNA: Dorothy conseguiu desfrutar sua vida? Me incomoda que alguém tenha de lutar por tanto tempo.

JOKO: Sim, imagino que ela às vezes desfrutou sua vida, antes mesmo de ter visto o que era. Todos nós desfrutamos a nossa vida às vezes. Mas por baixo do contentamento e da gratificação está a ansiedade. Ainda estamos em busca de algo atrás da porta e temos medo de nunca o encontrarmos. Pensamos: “Se eu tivesse isto ou aquilo seria feliz”. Uma época de momentos prazerosos não elimina essa inquietude subliminar. Não existem atalhos. Devemos enfim enxergar quem somos e o que é esse aposento que está atrás da porta.

ALUNO: Comigo o sentimento que está por baixo de tudo é o medo. É como uma corrente subterrânea sutil que flui junto com tudo o que eu faço. Minha vida toda não fui plenamente consciente dele, mas ele estava lá, dirigindo a minha vida.

JOKO: Quando sentamos para praticar, levamos nossa atenção para essa sutil corrente subterrânea. Isso quer dizer notar nossos pensamentos e as sutis contrações de nosso corpo. Para Dorothy isso aconteceu quando sua obsessão com a porta trancada começou a abrandar e ela começou a prestar mais atenção nas condições do resto da casa. Suas esperanças começaram a morrer.

ALUNA: Basta que tomemos conta de nossas tarefas imediatas.

JOKO: Certo. E tomar conta do que precisa ser cuidado remete-nos de volta ao que somos neste momento.
Na história sobre Dorothy o que vocês pensam acerca dos aposentos entulhados na casa?

ALUNO: Apegos. Pensamentos a respeito de um monte de coisas. Recordações.

JOKO: Recordações, fantasias, esperanças.

ALUNA: Parece que, quando temos uma coisa imediata a fazer, nossa tendência é focalizar, em vez disso, o medo, ou a ansiedade, ou qualquer outra coisa – a porta trancada – e esquecer de prestar atenção na tarefa que está à nossa frente. De certo modo, o medo (ou o que for) é irrelevante. Existe essa tarefa a ser feita e só precisamos fazê-la, com ou sem medo. Luto contra a minha vida porque em vez de fazer o que precisa ser feito, eu luto contra o medo subliminar, tento destrancar aquela porta.

JOKO: Certo. Paradoxalmente, o único meio de abrir a porta é esquecendo a porta.

Os alunos costumam queixar-se comigo de que, quando se sentara para praticar, algo interfere em sua percepção consciente: “Fico aéreo”; “Fico tão nervosa! Não consigo ficar quieta”. Por trás dessas queixas está o pensamento de que, a fim de sentar e praticar com alguma eficiência, temos de nos livrar de todas as coisas desagradáveis; a porta trancada tem de ser aberta para podermos alcançar todas as coisas agradáveis.

Se estamos aéreos, estamos aéreos. Se estamos nervosos, estamos nervosos. Essa é a realidade de nossa vida naquele momento. Uma boa prática sentada significa simplesmente estar presente com isso: ser esse nervosismo ou esse alheamento.

As pessoas se dão a imensos trabalhos quando se trata de eliminar sentimentos desagradáveis. “Estou tenso; tenho de participar de um workshop para relaxar.” Então a pessoa vai para o workshop e isso a faz relaxar – mas por quanto tempo? Querer aliviar a tensão é como olhar para a porta trancada, tentando imaginar o modo de abri-la. Se nos obcecarmos com essa idéia de abrir a porta, poderemos descobrir técnicas de abri-la por alguns momentos; mas então iremos nos perceber remetidos de volta a nossas vidas, tal como elas são, vivendo na mesma velha casa de sempre. Em vez de nos obcecarmos com a porta trancada, precisamos ir tocando a nossa vida adiante, o que significa limpar a casa, tomar conta das crianças, ir para o trabalho etc.

ALUNA: Uma amiga e eu estávamos há pouco falando de como tínhamos tido um ano difícil. Enquanto estávamos com vinte, trinta anos, nós duas tínhamos esperanças de que as coisas fossem melhorar para nós. Agora, na casa dos quarenta, chegamos à desanimadora conclusão de que isso não irá acontecer: nossas vidas não vão melhorar em nada!

JOKO: Paradoxalmente, essa dolorosa decepção com o futuro ajuda-nos a apreciar a vida como ela é. Só quando desistirmos da esperança de que as coisas fiquem melhores é que poderemos chegar à constatação de como elas estão bem do jeito que estão.

ALUNO: Há pouco tempo tive uma percepção semelhante. Durante anos eu viera me dizendo que minha vida seria melhor quando eu tivesse poupado dinheiro suficiente para viver em semi-apo-sentadoria. Teria mais tempo para um serviço voluntário. Teria mais tempo de fazer uma prática mais consistente, de ler mais etc. Agora estou começando a me dar conta de que o que preciso fazer está justamente aqui, no trabalho. Se estou tentando terminar alguma coisa e alguém entra e me distrai, isso é justamente o que preciso fazer naquele instante. O que eu deveria estar fazendo é exatamente o que estou fazendo.

JOKO: Para concluir, vamos perguntar a nós mesmos: “Como é que estou tentando destrancar a porta em vez de estar simplesmente vivendo a minha vida?”. Todos estamos tentando destrancar a porta, encontrar a fórmula certa. Estamos em busca do professor certo, do parceiro perfeito, do emprego inacreditável etc. Constatarmos que estamos tentando destrancar a porta é imensamente valioso; ajuda-nos a ver o que nossa vida realmente é.