Muitos repetem, mas poucos conhecem de fato, o conceito andino de Sumak Kawsay. Ele pode ter enorme impacto tanto na vida cotidiana quanto para uma nova economia
Por Débora Nunes – Outras Palavras
A expressão indígena andina Sumak Kawsay, que significa Viver Plenamente, tornou-se mundialmente conhecida como “Bem Viver” e expressa uma alternativa ao catastrófico desenvolvimento atual. Ao invés de aumento do PIB, da riqueza individual, do consumo, do sucesso a qualquer preço e da vida em velocidade estonteante, o Bem Viver busca simplesmente estar bem consigo, com os outros e com a Natureza. Talvez seja fácil de dizer e difícil de realizar, particularmente quando se está inteiramente inserido no sistema vigente, sem ver saídas. Mas isso não é uma invenção teórica, é uma prática milenar de vida comunitária e está sendo vivida hoje por milhões de pessoas.
A simplicidade do Sumak Kawsay vem dos seus princípios, que começam na vida cotidiana e acabam por mudar tudo, pois é o próprio sentido da vida, buscando “estar bem” com quem somos, com os que nos rodeiam e com quem nos nutre, a Natureza, que se expressa. Os 13 princípios da busca de equilíbrio são: saber nutrir-se do que é são, saber beber sentindo o fluxo da vida, saber dançar em conexão com o Universo, saber dormir entre um dia e outro, saber trabalhar alegremente, saber estar em silêncio meditativo, saber pensar com a mente e o coração, saber amar e ser amado, saber escutar a si, aos outros e à Mãe Terra, saber falar construtivamente, saber sonhar pra ter uma melhor realidade, saber caminhar sentindo-se acompanhado pelas boas energias e saber dar e receber.
Como é comum nas lógicas indígenas, a passagem de cada ser pelo mundo é vista a longo prazo e o sentido de comunidade é sempre presente. Honrar os bens comuns – sejam eles materiais ou sutis, como a água ou o ar e também os ritos e a cultura, é parte integrante do sentido da vida. Toda essa busca do essencial, desde as coisas mais simples, como os 13 princípios, até o vínculo sagrado com a Natureza, dá a vida um sentido de certo e errado, de importante e desimportante, que nos faz buscar a plenitude, naturalmente. O menos é mais e o simples é o caminho.
O Bem Viver torna-se político quando expande sua lógica para o sistema econômico, que deve ter bases comunitárias e ser orientado pelos princípios de solidariedade, de reciprocidade e de corresponsabilidade. Tudo isso só sendo possível em processos políticos de participação plena, de decisões compartilhadas. As Constituições do Equador e da Bolívia, ao incorporarem a ideia do Bem Viver como base, inauguraram no mundo algo novo: os direitos da Natureza, onde os humanos não são o mais importante, mas mais um elo da Teia da Vida. Esse fazer parte, ao contrário de limitar nossa existência, a dignifica, por nos fazer ser aquilo que é nossa missão: jardineiros/as da vida, cuidadores/as da Terra.