Preceito 04 (Gregório de Matos)
Vejo, que morrem de fome
os Pais daquelas, e os Tios,
ou porque os vêem Lavradores,
ou porque tratam de ofícios.
Pois que direi dos respeitos,
com que os tais meus mancebinhos
tratam esses Pais depois
que deixam de ser meninos?
Digam-no quantos o vêem,
que eu não quero repeti-lo,
a seu tempo direi como
criam estes morgadinhos.
Se algum em seu testamento
cerrado, ou nuncupativo
a algum parente encarrega
sua alma, ou legados pios:
Trata logo de enterrá-lo
com demonstrações de amigo,
mas passando o Resquiescat
tudo se mate no olvido.
Da fazenda tomam posse
até do menor caquinho;
mas para cumprir as deixas
adoecem de fastio.
E desta omissão não fazem
escrúpulo pequenino,
nem se Ihes dá, que o defunto
arda, ou pene em fogo ativo.
E quando chega a apertá-los
o tribunal dos resíduos,
ou mostram quitações falsas,
ou movem pleitos renhidos.
Contados são, os que dão
a seus escravos ensino,
e muitos nem de comer,
sem Ihes perdoar serviço.
Oh quantos, e quantos há
de bigode fernandino,
que até de noite às escravas
pedem selários indignos,
Pois no modo de criar
aos filhos parecem símios,
causa por que os não respeitam,
depois que se vêem crescidos.
Criam-nos com liberdade
nos jogos, como nos vício,
persuadindo-lhes, que saibam
tanger guitarra, e machinho.
As Mães por sua imprudência
são das filhas desperdício,
por não haver refestela,
onde as não levem consigo.
E como os meus ares são
muito coados, e finos,
se não há grande recato,
têm as donzelas perigo.
Ou as quebranta de amores
o ar de algum recadinho,
ou pelo frio da barra
saem co ventre crescido.
Então vendo-se opiladas,
se não é do santo vínculo,
para livrarem do achaque,
buscam certos abortinhos.
Cada dia o estou vendo,
e com ser isto sabido,
contadas são, as que deixam
de amar estes precipícios.
Com o dedo a todas mostro,
quanto indica o vaticínio,
e se não querem guardá-lo,
não culpam meu domicílio.