O rio da minha infância

Coluna da Luisa
Luisa é uma das criadoras do Coletivo Córrego da Tiririca. Ela nos brinda com suas considerações sobre diversos aspectos ligados direta ou indiretamente com nosso projeto.



O Rio Joana nasce dentro da floresta da Tijuca, mais especificamente na Pedra da Mina, na encosta do morro do Andaraí maior. Dali entrecorta os bairros cariocas do Grajaú, depois Andaraí, passando por Vila Isabel, pela Tijuca e depois São Cristóvão, atravessando por dentro da Quinta da Boa Vista rumo a baía de Guanabara.

Este é o caminho do rio Joana, o rio da minha infância.

Rio Joana na Pedra da Mina- Fonte Ecomuseu Amigos do Rio Joana.

Mas o que poucos sabem é que este já foi um rio em correnteza forte, cheio de peixes e também navegável. Os povos indígenas Tamoios o percorriam em suas canoas e ali pescavam. No século XVII era nomeado de rio dos Morcegos, pelos colonizadores portugueses, dada a grande quantidade de árvores de sapoti e outras frutíferas, que atraíam esses mamíferos voadores as margens do vale fluvial. Mas os povos originários que ali viviam o chamavam de Andira-hy. Mais tarde o vale fluvial banhado por suas águas levou o nome de Andaraí.

Em algum momento esse rio Andira-hy passou a ser chamado de rio Joana, e assim segue sua história.

Era um canal aberto na confluência das ruas Barão de Mesquita e Maxwell, quando nasci. Nas minhas lembranças de pequena, antes mesmo de começar a ir para a escola, estavam as obras de canalização do rio, para controlar as enchentes na região. Assustavam-me as enormes escavadeiras e não gostava de passar por ali quando atravessava a ponte para ir com minha mãe a padaria.

Rio Joana sendo escondido por concreto

Não tenho lembrança de ter visto o rio Joana como um espaço de vida quando era criança. Mas na adolescência certa vez subi, em uma excursão do colégio, pela reserva florestal do Grajaú e ali pude ver o rio vivo, com peixes e mata. Eu não sabia que aquele canal de cimento e concreto que passava no meio da Rua Maxwell era um rio de verdade.

Rio Joana na Quinta da Boa Vista- Fonte Biblioteca Nacional

Mas o rio Joana ainda ali vivia. Nas fortes chuvas do verão ele voltava à vida e fluía a olhos vistos, como um fantasma do passado. O rio inundava ruas, suas águas correntes, velozes.

No início do Século XX, o então Prefeito Pereira Passos, colocava o rio Joana desembocando artificialmente no rio Maracanã e fez o traçado do Canal do Mangue, escoando as águas dos alagados e brejos da Ponte dos Marinheiros até a baía. Porém as obras de engenharia hidráulica da época não foram suficientes para acabar com as enchentes, que paralisavam a Tijuca, como acontecia rotineiramente na Praça da Bandeira.

Mas havia outros planos para controlar as fatídicas enchentes que acometiam a grande Tijuca e seus rios. Pontos de alagamento se davam nas Praças, algumas eram antigos alagados, como a pracinha Niterói e também na Praça da Bandeira.

Já neste século XXI o Programa de Combate às Enchentes da Grande Tijuca desviou o curso do Rio Joana jogando parte das águas diretamente na Baía de Guanabara, passando sob o Maracanã, o Morro da Mangueira e o início da Avenida Brasil na altura do Caju, através do maior túnel de drenagem urbana construído no país. Com a obra, o trecho que atravessava a quinta da Boa Vista em São Cristóvão foi desviado e o leito dentro do parque acabou secando…

A memória do rio vive dentro do Maciço da Tijuca, onde se encontram suas nascentes, que ainda fluem, sem saber que o destino das suas águas doces é um longo canal de drenagem até se tornarem libertas, na baía.

E na memória da sua infância tem um rio? Qual é ele? Como está agora?

Agradecimentos:Ao Ecomuseu Amigos do Rio Joana e Biblioteca Nacional pelas imagens.

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