Retribuindo

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Retribuindo (Mário de Andrade)

Por que os homens não me escutam? Por que os governadores
Não me escutam? Por que não me escutam
Os Plutocratas e todos os que são chefes e são fezes?
Todos os donos da vida?
Eu lhes daria o impossível e lhes daria o segredo,
Eu lhes dava tudo aquilo que fica pra cá do grito
Metálico dos números, e tudo
O que está além da insinuação cruenta da posse.
E se acaso eles protestassem, que não! que não desejam
A borboleta translúcida da humana vida, poque preferem
O retrato a ólio das inaugurações espontâneas,
com béstias de operário e di oficial, imediatamente inferior,
E palminhas, e mais os sorrisos das máscaras e a profunda comoção,
Pois não! Melhor que isso eu lhes dava uma felicidade deslumbrante
De que eu consegui me despojar porque tudo sacrifiquei.
Sejamos generosíssimos. E enquanto os chefes e as fezes
De mamadeira ficassem na creche de laca e lacinhos,
Ingênuos brincando de felicidade deslumbrante:
Nós nos iríamos de camisa aberta ao peito,
Descendo verdadeiros ao léu da corrente do rio,
Entrando na terra dos homens ao coro das quatro estações.
(… )
Como é possível que o amor se mostre impotente assim
Ante o ouro pelo qual o sacrificam os homens,
Trocando a primavera que brinca na face das terras
Pelo outro tesouro que dorme no fundo baboso do rio!

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