Elegia quase uma ode

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Elegia quase uma ode (Vinicius de Moraes

I
Choro.
Choro atrozmente, como os homens choram.
As lágrimas correm milhões de léguas no meu rosto que o pranto fez gigantesco.
Ó, lágrimas, sois como borboletas dolorosas
Volitais dos meus olhos para os caminhos esquecidos…
Meu pai, minha mãe, socorrei-me!
Poetas, socorrei-me!
Penso que daqui a um minuto estarei sofrendo
Estarei puro, renovado, criança, fazendo desenhos perdidos no ar…
Venham me aconselhar, filósofos, pensadores
Venham me dizer o que é a vida, o que é o conhecimento, o que quer dizer a memória
Escritores russos, alemães, franceses, ingleses, noruegueses
Venham me dar idéias como antigamente, sentimentos com antigamente
Venham me fazer sentir sábio como antigamente!
Hoje me sinto despojado de tudo que não seja música
Poderia assoviar a idéia da morte, fazer uma sonata de toda a tristeza humana
Poderia apanhar todo o pensamento da vida e enforcá-lo na ponta de uma clave de Fá!

Minha Nossa Senhora, daí-me paciência
Meu Santo Antonio, daí-me muita paciência
Meu São Francisco de Assis, daí-me muitíssima paciência!
Se volto os olhos tenho vertigens
Sinto desejos estranhos de mulher grávida
Quero o pedaço do céu que vi há três anos, atrás de uma colina que só eu sei
Quero o perfume que senti não me lembro quando e que era entre sândalo e carne de seio.
Tanto passado me alucina
Tanta saudade me aniquila
Nas tardes, nas manhãs, nas noites da serra.
Meu Deus, que peito grande que eu tenho

Que braços fortes que eu tenho, que ventre esguio que eu tenho!
Para que um peito tão grande
Para que uns braços tão fortes
Para que um ventre tão esguio
Se todo meu ser sofre da solidão que tenho
Na necessidade que tenho de mil carícias constantes da amiga?

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