Preceito 03 (Gregório de Matos)
Pois no que toca a guardar
dias Santos, e Domingos:
ninguém vejo em mim, que os guarde,
se tem, em que ganhar jimbo.
Nem aos míseros escravos
dão tais dias de vazio,
porque nas leis do interesse,
é preceito proibido.
Quem os vê ir para o templo
com as contas e os livrinhos
de devoção, julgará,
que vão p’ra ver a Deus Trino:
Porém tudo é mero engano,
porque se alguns escolhidos
ouvem missa, é perturbados
desses, que vão por ser vistos.
E para que não pareça,
aos que escutam, o que digo,
que há mentira, no que falo
com a verdade me explico:
Entra um destes pela Igreja,
sabe Deus com que sentido,
e faz um sinal-da-cruz
contrário ao do catecismo.
Logo se põe de joelhos,
não como servo rendido,
mas em forma de besteiro
cum pé no chão, outro erguido.
Para os altares não olha,
nem para os Santos no nicho,
mas para quantas pessoas
vão entrando, e vão saindo.
Gastam nisto o mais do tempo,
e o que resta divertidos
se põem em conversação,
com os que estão mais propínquos
Não contam vidas de Santos,
nem exemplos ao divino,
mas sim muita patarata,
do que não há, nem tem sido.
Pois se há sermão, nunca o ouvem,
porque ou se põem de improviso
a cochilar como negros,
ou se vão escapulindo.
As tardes passam nos jogos,
ou no campo divertidos
dando Leis, e dando arbítrios.
As mulheres são piores,
porque se lhes faltam brincos
manga a volá, broche, troço,
ou saia de labirintos,
não querem ir para a Igreja,
seja o dia mais festivo,
mas em tendo essas alfaias,
saltam mais do que cabritos.
E se no Carmo repica,
ei-las lá vão rebolindo,
o mesmo para São Bento,
Colégio, ou São Francisco.
Quem as vir muito devotas,
julgará sincero, e liso,
que vão na missa, e sermão
a louvar a Deus com hinos.
Não quero dizer, que vão,
por dizer mal do Maridos,
aos amantes, ou talvez
cair em erros indignos.
Debaixo do parentesco,
que fingem pelo apelido,
mandando-lhes com dinheiro
muitos, e custosos mimos.